Você pode nem perceber, mas grande parte do seu dia já está no automático, segundo estudo da Universidade de Duke, nos Estados Unidos. Na prática, isso quer dizer que sua rotina está repleta de atividades feitas “sem pensar”.
Mas o que parece uma boa notícia pode ser um obstáculo na construção de novos comportamentos – afinal, parte do processo de criar um hábito é mudar algo na sua rotina, e é mais difícil alterar aquilo que opera de forma autônoma. Se a tarefa já não é tão simples individualmente, como criar hábitos financeiros em família? E o que isso tem a ver com dinheiro?
O que os hábitos têm a ver com dinheiro?
Segundo os pesquisadores da Universidade de Duke, dos Estados Unidos, David Neal, Wendy Wood e Jeffrey Quinn, um hábito é tudo aquilo que não apenas é feito repetidamente, mas de forma quase inconsciente. “São respostas executadas com controle consciente mínimo”, afirmaram em estudo.
É neste ponto que as pessoas costumam confundir hábitos com rotina – e essa confusão é um dos obstáculos para a construção dessas respostas automáticas, segundo Nir Eyal, escritor e professor da Universidade Stanford, nos Estados Unidos.
Ele explica no livro “Como dominar a sua atenção e assumir o controle da sua vida” que um hábito é um tipo de rotina, mas nem toda rotina é um hábito. “Enquanto a rotina pode ser algo desconfortável de fazer, exige esforço e pode ser facilmente deixada de lado, um hábito parece desconfortável quando não o praticamos”, diz.
E o que isso tem a ver com dinheiro?
Grande parte das decisões financeiras tomadas pelas pessoas também está no automático. É puro hábito, segundo concluiu Daniel Kahneman, psicólogo e prêmio Nobel de Economia. Ao estudar o funcionamento do cérebro no modo como lidamos com dinheiro, ele criou a teoria das duas formas de pensar:
O sistema 1, que dá respostas automáticas e rápidas com base em experiências semelhantes passadas; e o sistema 2, que elabora o pensamento antes de chegar a uma conclusão. Kahneman concluiu que operamos no sistema 1 na maior parte do tempo. É por isso que é tão simples pedir delivery, fazer aquela compra no cartão de crédito, entrar em um parcelamento sem pensar.
Por que criar hábitos financeiros em família?
Porque esse trabalho em grupo não apenas facilita o controle financeiro dos pais como incentiva as crianças a desenvolverem hábitos que vão beneficiá-las no futuro, segundo a planejadora financeira Viviane Ferreira.
“São os hábitos que fazem uma família ter as finanças equilibradas ou estar endividada. E fazer esse trabalho em grupo, incluindo as crianças, contribui não apenas para o presente, mas para o futuro delas, porque quanto mais cedo elas aprendem hábitos financeiros saudáveis, mais fácil será lidar com dinheiro na fase adulta”, explica.
Desenvolvimento de habilidades sociais
Para criar hábitos em família, os pais precisam envolver os filhos ativamente. Ou seja, é uma oportunidade de as crianças desenvolverem habilidades sociais, como comunicação, trabalho em equipe e resolução de conflitos desde cedo; e também características importantes para as finanças, como autodisciplina, organização e responsabilidade.
Quanto menores forem as crianças, mais elas aprendem pelo exemplo. Por isso, ao criar hábitos em família, as crianças conseguem observar o comportamento e decisões dos pais sobre dinheiro. “Elas tendem a repetir o comportamento dos pais e, se eles são organizados com dinheiro, elas entendem isso como algo natural”, diz Ferreira.
Isso não significa, porém, que famílias desorganizadas financeiramente não conseguem ensinar aos filhos comportamentos saudáveis. Na verdade, criar hábitos financeiros em família é uma oportunidade para os pais arrumarem as finanças.
Como criar hábitos financeiros em família?
O processo para criar um hábito em família tem muitas semelhanças com a dinâmica individual. A diferença é que, em grupo, é preciso fazer combinados e chegar a consensos – o que pode ser um complicador. Por outro lado, grupos tendem a se apoiar, tornando o processo mais fácil e até divertido.
O que você e sua família querem mudar? Gastar menos com pedidos no delivery? Investir mais para a viagem de férias? Não importa o comportamento, é importante que ele seja claro e específico. Além disso, vale aqui um tempo para analisar se o comportamento que quer criar pode ser mesmo um hábito. Isso porque aquilo que você quer mudar pode não ser o hábito que precisa desenvolver.
Repita, repita e repita
A ciência do comportamento é clara nesse sentido: não é possível criar um novo hábito sem repetição. Ou seja, não adianta apenas colocar o comportamento na rotina, é preciso repeti-lo até que ele se torne automático e que você e sua família sintam que perderam algo ao não fazê-lo.
Mas o processo não é linear, principalmente quando envolve crianças. Sim, em alguns dias, você não vai conseguir cozinhar, seja pelo cansaço ou por um imprevisto – é o ponto de inflexão. O importante não é focar na ação que não foi feita, mas voltar para ela o quanto antes. Reforçar os motivos que movem sua família em direção a esse hábito e até rever as recompensas ajudam no processo.